Santo Agostinho (354-430) consta da lista dos santos favoritos que despertavam em Teresa uma grande devoção. Desde criança, Maria e os santos eram os seus modelos de santidade; nunca deixou de pedir com frequência a sua intercessão junto de Deus. S. José e os apóstolos têm uma posição cimeira nas suas preferências, como também alguns convertidos: S. Paulo, S. Madalena e S. Agostinho. Na sua autobiografia, narra o impacto determinante das Confissões de S. Agostinho no acontecimento de graça que foi a sua conversão em 1554, com 39 anos e quase vinte anos de vida religiosa no Mosteiro da Encarnação. Estava consciente da incoerência da vida, mesmo depois de ter voltado à oração que tinha abandonado durante uns tempos. Os seus desejos de maior entrega a Jesus na oração e na vida contrastava com algumas vaidades mundanas, apego às amizades e muita auto-confiança para superar as contradições da vida (V, 7 e 8).
«Por essa altura, deram-me as Confissões de Santo Agostinho. Até parece que foi o Senhor que as mandou, porque nunca as tinha procurado nem as tinha visto. Eu gosto muito de Santo Agostinho, porque o mosteiro onde estive como educanda [nos seus 16-17 anos] era da sua Ordem, e por ter sido pecador… Quando comecei a ler as Confissões, parecia ver-me lá retratada e, então, comecei a encomendar-me a este glorioso santo» (V 9,7-8). As Confissões acabavam mesmo de ser traduzidas do latim e publicadas em Salamanca. Teresa sente uma forte empatia e emoção ao ler a obra; quando descobre a cena da conversão (Conf. 8, 12), «não me parecia senão que o Senhor me falava a mim. O coração apertou-se-me de dor e fiquei toda desfeita em lágrimas por longo tempo, sentindo uma grande aflição e tormento.» No mesmo período, ocorre o encontro de Teresa com uma imagem de ‘Cristo muito chagado’, que é o acontecimento mais conhecido da sua conversão: «mal pus os olhos nela, perturbei-me toda por O ver naquele estado que representava bem o que Ele passou por nós.» (V 9,1). Abrem-se-lhe os olhos, ao sentir-se olhada por Quem a redimiu. «Lancei-me aos seus pés num choro de intensas lágrimas e pedi-Lhe que me fortalecesse de uma vez para sempre a fim de não mais o ofender» (V 9,1).
No capítulo da conversão, Teresa conta primeiro a sua perturbação olhando a imagem de Cristo e o pedido para não mais O ofender, depois a emoção e empatia na leitura das Confissões de S. Agostinho. Estudiosos da vida e obra de Teresa de Jesus propõem uma nova ordem dos episódios da conversão: primeiro foi a leitura das Confissões, que a abala e desestabiliza; depois a imagem, “diante da qual Teresa reagiu com expressões semelhantes às do livro agostiniano” (Ros, 2016). O livro revelou-se decisivo, pois todo o seu ser estava como que à espera de reconhecer a sua impotência em mudar de rumo pelas suas próprias forças.
A influência de S. Agostinho na sua conversão reflete-se nas suas obras fundamentais, da Vida ao Castelo Interior, das Exclamações às Poesias. Em todas as obras, encontram-se referências do santo no que toca à experiência do pecado e da graça, à interioridade, à busca de Deus e ao abandono. Recorda particularmente a divisa «Tarde Vos amei… buscava‑Vos fora e estava dentro de mim» (Conf. 10, 27, in V 4, 6; C 28, 2; 4M 3,3, E 4,1). Ou ainda «Dai‑me o que ordenais e ordenai‑me o que quiserdes» (Conf. 10, 29, in V 13,3; CC 4,9; E 5, 2; P 2 e 8).
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