Do coração de Cristo, aberto pela lança, jorrou para o mundo todo o Espírito Santo que dá vida ao mundo. O “grão de trigo” (Jo 12,24) ensina que é preciso morrer para viver. O grão é mergulhado na terra para produzir fruto, morre e perde a sua condição inicial e transforma-se em uma vida nova. Quem não arrisca sua vida amando, ficará esclerosado, encarquilhado, morrerá antes de estar morto.
O grão de trigo é a centelha do divino que deve penetrar nos meandros do inconsciente, como o fermento na massa. Quando perde a consciência do que tinha sido, irá crescer. Chega a hora da manifestação. Passará pela desestruturação e pela reestruturação das profundezas. Surge a nova vida. Não haverá mais nada para aprender com a morte.
Quem ama a sua vida vai perdê-la. Quem não morre para a sua “psique”, que abrange o consciente e inconsciente, o racional e irracional, as paixões, as pulsões, as concepções e ideologias, não viverá. O apego a este mundo será um entrave para despertar o mundo espiritual que São João chama de único mundo real. É o mundo construído pelo Espírito Santo que Cristo nos deixou.
Ficamos apegados às nossas representações da realidade, nossas concepções e conhecimentos. Corre-se o risco de perder tudo. Na hora do despertar para a vida nova, veremos que não existe o mundo como imaginávamos. Nossas representações não existem, não têm existência em si mesmas. Só existe é para além de qualquer representação. Quem não está apegado à sua visão psíquica do mundo e da vida e é capaz de suportar a morte de suas representações, poderá nascer para uma nova consciência, entrar no mundo da não-morte a que Jesus dá o nome de vida eterna.
“O Espírito é que vivifica, a carne de nada vale” (Jo 6,63). A melhor tradução é “a carne nada sabe”. A carne não é má. É verdade que se a matéria não for informada a partir de dentro acabará por decompor-se. A carne sem o sangue não é corpo, é cadáver. O finito não pode compreender o infinito, o tempo não pode abarcar a eternidade, mas a carne que acolhe o Espírito torna-se capaz de conhecimento. Ninguém pode conhecer o “Eu sou” do seu ser se não estiver animado pelo sopro que vem da origem.
Por Dom Wilson Tadeu Jönck, SCJ
Artigo publicado na edição 301, de junho de 2023, do Jornal da Arquidiocese, página 2.